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Ana Aguiar Ricardo

Esta foi uma entrevista conduzida pelo colaborador do departamento de Comunicação, Miguel Milheiro. A entrevistada foi a professora Ana Aguiar Ricardo, ex-coordenadora de MIEQB, ex-presidente do Departamento de Química, e regente/docente em várias Unidades Curriculares, tanto do primeiro como do segundo ciclo de estudos. As sua áreas de investigação, sendo reconhecida internacionalmente, são a Química Verde e as tecnologias supercríticas. É uma professora incontornável do percurso dos estudantes do curso e por isso, aqui, podem conhecer a pessoa por trás do nome e do manto da docência.

Seguem as questões e as respostas, sem mais demora:



Qual é a formação da professora?

Sou Engenheira Química. Tirei (o curso) no Instituto Superior Técnico, em 1987. Depois,

entrei para esta escola, a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade NOVA de

Lisboa, para o lugar de assistente, que é uma figura que já não existe na maior parte das

universidades de ciências. Primeiro fui assistente estagiária e para passar a assistente tive

de fazer Provas de Capacidade Científica e de Aptidão Pedagógica. Tive até de dar uma aula em que fui avaliada.

Comecei o doutoramento no final de 1989 e fi-lo cá na NOVA, orientada pelo professor

Manuel Nunes da Ponte. Depois do doutoramento, tive muita vontade de ter uma

experiência no estrangeiro e então decidi ir para Inglaterra fazer um pós-doutoramento, em

1995, na Universidade de Nottingham. Durante o doutoramento, confesso que tinha alguma

pena de só trabalhar em termodinâmica clássica. Os colegas do laboratório estavam a

trabalhar com fluidos supercríticos, solventes limpos, verdes, tecnologia muito inovadora e

eu tinha imensa vontade de entrar nessa área. Então no post-doc comecei um trabalho

ainda muito de termodinâmica, mas já com o objetivo de determinar os pontos críticos de

misturas de substâncias através de medidas de velocidade do som. Desenvolvi toda uma

nova técnica de medida. Uma das misturas que estudei tinha aplicação na indústria, na

síntese de polímeros. Foi uma experiência muito, muito gira!

No final do pós-doutoramento, vim para cá (Portugal). Regressei e comecei com trabalhos novos em síntese de polímeros em CO2 supercrítico. E explorei novas áreas novas no meu laboratório e por aí avancei.


E o que levou a professora a escolher o curso?

Na altura a razão principal foi o gosto que tinha pela química, mas ao mesmo tempo,

também achava que a parte de ser engenheira era interessante porque dava aquele lado de

aplicação e de poder ter mais ação na sociedade. Pelo menos com a visão que eu tinha

naquela altura do que era a engenharia química, porque permitia criar riqueza. O meu pai,

que teve um grande desgosto, queria que fosse para medicina porque tinha notas muito boas, mas eu não fui, fui para o Técnico para ir para engenharia química.

Ainda houve uma altura em que me arrependi um bocadinho, mas depois, concluí o curso.


E quais são as principais mudanças que a professora deteta desde que tirou o curso,

até agora?

Acho que os engenheiros de agora são ótimos. Não tenho nada essa visão de os

engenheiros de antigamente serem melhores do que os de agora. De todo. Acho que temos

que ir aprendendo, que há partes de conhecimento que já não precisamos de saber com

profundidade porque estão acessíveis de muitas formas através da Internet. Acho que,

provavelmente, há dois tipos de engenharia. Uma que é uma engenharia muito específica

porque há áreas do conhecimento que são tão avançadas que as pessoas têm que estar

muito focadas em certos assuntos para os dominarem. Há outras áreas mais

interdisciplinares. Um engenheiro tem que saber muito da sua área de conhecimento, do

seu campo de ação, mas tem que ter muita capacidade de comunicação para perceber e

colaborar com outras pessoas de outros saberes porque considero que a ciência é, cada vez, mais multidisciplinar. Este facto obriga a que um engenheiro de uma determinada área não possa trabalhar só na sua área mas tenha que trabalhar relacionando-se com outros de outras áreas e portanto a parte da comunicação é, cada vez, mais importante. Temos de ter uma linguagem que seja percetível a pessoas de áreas diferentes.


E qual acha que deva ser a primeira reforma a realizar ao sistema de ensino?

Acho que devíamos começar a fazer um ensino baseado em projetos. Por exemplo, temos

um caso de estudo, queremos desenvolver um projeto, para tal precisamos de usar

conhecimentos e competências de diferentes unidades curriculares que podem até ser

lecionadas em Departamentos que não o de Química. Os vários saberes adquiridos vão ser

aplicados numa nova situação no desenvolvimento do projeto. Para quê? Para não termos

gavetas de conhecimento e consolidarmos. É uma estratégia pedagógica diferente, eu

gostava de ter formação para a saber implementar. Acho que os professores precisam de

receber formação pedagógica, temos de conhecer estas novas metodologias de ensino.

Já pensei que no projeto final de licenciatura (e.g. Projeto Integrador de Engenharia Química

e Biológica, 6o semestre) seria a oportunidade ideal para aplicar esta estratégia pedagógica

promovendo a colaboração de professores de departamentos diferentes. Podia-se ir mais

longe juntando professores da matemática, professores da física, de materiais, de

informática, etc. Ou então interligar, ter um projeto interdepartamental, onde haveria

alunos dos vários departamentos que contribuiam para esse projeto com as áreas de saber

deles. Até podia ter uma apresentação pública, para a comunidade toda, no Grande

Auditório.


Propina gratuita? Não sei se a professora quer responder aqui a esta pergunta.

Ah! não me importo nada. Se não for politicamente correta, paciência. É assim, tenho

“mixed feelings” em relação à propina gratuita. Num mundo ideal, claro que a propina seria

gratuita. Mas eu não vivo num mundo ideal, ando com os pés na terra. Portanto, o que é

que eu acho? Acho que as pessoas, quando não pagam as coisas, não lhes dão muito valor.

Os alunos acham as propinas caras, mas depois faltam às aulas, quando até deveriam

querer mais. Por isso, se calhar as propinas até são baratas (em tom jocoso). Alguém paga

sempre pelas coisas. As pessoas querem que se deixe de pagar isto ou aquilo, mas é à custa de alguém ir pagar de outra forma. Alguém que não o utilizador. Se calhar vão-se pagar mais impostos. Mais impostos sobre a classe média que já paga uma brutalidade de impostos. Concordo que todos temos de contribuir para a sociedade, mas, talvez seja mais justo que aqueles que utilizam o serviço das universidades sejam os que pagam mais alguma coisa por isso porque são eles que vão beneficiar desse investimento. Semelhante ao que acontece com o pagamento de portagens nas autoestradas, nós também pagamos portagem quando andamos na auto-estrada.


Tem algum conselho para dar aos novos alunos de EQB?

Eu tenho. Tenho vários conselhos. Seriedade no trabalho. Não é só na parte técnica, na

parte ética também. Acho que são valores que as pessoas não deviam descuidar e não

deviam achar que são menos importantes. Outro é o respeito. Respeito quer pelos

professores, quer pelos colegas, quer pelos funcionários, por todas as pessoas à volta. A

noção de que somos todos igualmente importantes. Somos todos seres humanos, não há

ninguém mais importante que o outro, cada um nas suas funções. Portanto, acredito que o

respeito é um valor extremamente importante na sociedade e os alunos universitários

devem fazer disso um ponto de honra. Em relação ao trabalho como estudante, terem essa seriedade e essa ética, e de realmente trabalharem bem. Trabalhar bem, e sobretudo

ganhar competências - são muito mais importantes do que as notas para o mundo do

trabalho. Não terem receio de ir ter com os professores para saberem mais. Mas têm que

aproveitar os tempos em que têm aulas, não é só tirar dúvidas fora das aulas. Haver uma

seriedade de comportamento, uma vontade de saber, acho que é muito importante. E

tentem conhecer-se a vocês próprios para perceberem se o que estão a fazer é mesmo o

que querem fazer.

Porque se nós gostarmos mesmo do que estamos a fazer e se tentarmos conhecer melhor

uma determinada área do saber, nós vamos gostar mais também. Nós só gostamos daquilo

que conhecemos, não gostamos do desconhecido. Até nos assusta um bocado, até nos mete medo. Portanto, quando começamos a conhecer algo melhor, começamos normalmente a gostar mais. Com o saber é muito assim. Se começarmos a dominar um pouco mais os assuntos, vamos começar a ganhar gosto por esse saber e tudo fica mais fácil. E os professores são as pessoas que mais querem que os estudantes saibam, a menos que seja uma pessoa muito fora do normal. Mas para um professor normal, o que o realiza mais é que os seus alunos saibam e tenham sucesso. E, portanto, acho que estamos todos a trabalhar em equipa. Devem ter isso presente na cabeça e aproveitarem os professores o melhor possível.


Quais são os hobbies preferidos da professora?

Eu faço coisas que, normalmente, estas gerações já não fazem muito. Gosto muito fazer

crochet, gosto muito de fazer bordados, gosto muito de fazer tricot. Estou muito virada para

os trabalhos assim desse tipo. As minhas filhas até já me deram um livro com os meus

trabalhos, com as coisas que fiz para elas, e está muito engraçado. Até costumo dizer que

foi dos presentes que mais gostei na vida. Gosto muito de viajar, também. Gosto muito de

ler. Gosto imenso de ler. Gosto imenso de música. Tenho pena de não saber tocar nenhum

instrumento, isso tenho.


Qual é o estilo de arte favorito da professora?

Arquitetura... Gosto imenso. Também gosto muito de escultura, pintura. Gosto muito de ver

exposições de pintura e de escultura, e vejo muitas aqui na nossa Biblioteca. Acho que

somos uns privilegiados com a Biblioteca que temos aqui no Campus. Sempre que posso,

venho às inaugurações que aqui há e gosto imenso de ouvir os artistas quando partilham os

momentos de criatividade que experimentaram. E, por isso, faço o desafio aos estudantes

para ver se tiram mais partido da Biblioteca, é um ótimo espaço do nosso Campus.


Qual é a sua melhor memória de infância?

Acho que é a memória dos miminhos que o meu pai me dava. Aquela ligação forte que eu

tinha com o meu pai. Acho que era, no fundo, um grande exemplo para mim.

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